No último dia 27, Florence concedeu uma entrevista exclusiva ao site Telegraph, para o qual revelou detalhes a respeito da carreira e o tão aguardado 4° ÁLBUM.
Abaixo, confira a tradução:
Neil McCormick, crítico musical:
Florence Welch está nervosa. “Fico muito ansiosa em entrevistas,” diz ela, com as bochechas pálidas ruborizadas e os olhos brilhando. “Sempre me senti inundada pelas emoções. Até sentada aqui agora eu quero chorar e não sei por quê”.
Estamos sentados lado a lado em um sofá de listras amarelas na sala de estar da líder da Florence and the Machine no sul de Londres. Ela mora em uma pequena casa georgiana pintada nas cores verde e marrom e decorada com tapetes estampados e antiguidades. As paredes estão cheias de obras de arte com molduras douradas, há bugigangas antigas em toda parte e uma quantidade incontável de livros está espremida em prateleiras ou empilhada em perigosas pirâmides no chão.
Obras de escritores norte-americanos como Lorrie Moore, John Berryman e Patti Smith estão lado a lado com a poesia de TS Eliot e uma bela edição da história de Pompeia escrita por Mary Beard. Florence me pega admirando essa biblioteca claramente hermética e ri. “Escondi os livros de autoajuda antes de você chegar,” brinca ela.
Vestindo uma delicada blusa floral e com o cabelo (tingido de) vermelho preso em tranças, ela é branca, esguia, de uma beleza impressionante e está visivelmente ansiosa. “Acho mais fácil me explicar nas músicas do que pessoalmente. As canções são como talismãs de proteção. No dia a dia, eu sou muito mais insegura e tímida.”
Em pessoa, ela passa longe da superstar que teve a multidão de Glastonbury na palma da mão em 2015. Como Florence and the Machine (um projeto solo, apesar do nome) ela lançou três álbuns aclamados pela crítica: Lungs (2009), Ceremonials (2011), e How Big, How Blue, How Beautiful de 2015, que liderou paradas nos dois lados do Oceano Atlântico, uma proeza que rendeu a ela um Prêmio Ivor Novello na categoria Sucesso Internacional, recebido este mês.
A música de Florence tende a ser intensa, dramática, movida por uma percussão vigorosa e uma imponente parede de som. Ao vivo, ela soma a intensidade da música com a exuberância de sua performance, correndo pelo palco em roupas esvoaçantes enquanto a voz extraordinária vai da intimidade apreensiva até a ousadia operística. A voz falada de Florence, por outro lado, é aguda, suave e trêmula.
“No palco, alguma coisa assume o controle. Quando eu canto, acontece uma imensa sensação de liberdade. Sou apaixonada pelo mundo e ao mesmo tempo tenho medo dele. Meus sentimentos são muito fortes. Na vida real eu preciso achar um jeito de controlá-los. O palco é o lugar onde tudo faz sentido e ninguém vai pensar que sou louca.”
Ela descreve suas músicas como uma forma de “se esconder a olhos vistos… Se eu disser para você que estou com dificuldades ou sofrendo, mas disfarçando e fazendo o barulho mais alto do mundo, consigo botar isso para fora. Posso falar a verdade, e ainda assim me esconder atrás do barulho que estou fazendo.” Para o How Big, How Blue, How Beautiful, o produtor Marcus Dravs a estimulou a baixar o tom e expor um lado mais vulnerável. “O que precisei aprender é que a moderação pode ser tão eficaz quanto gritar até derrubar a casa,” analisa.
A música sempre foi a forma de expressão escolhida pela cantora. Um conhecido meu era vizinho dos Welch quando ela era criança e se lembra da pequena Florence sempre em movimento, cantando a plenos pulmões.
“Minha infância se resume a pessoas gritando ‘Cala a boca, por favor!’ lá em casa o tempo todo. Minha mãe tentava escrever outro livro sobre a história do Renascimento e lá estava eu no andar de cima, cantando canções de musicais. Aí ela gritava: ‘Florence!’”
Florence nasceu eu Camberwell, sul de Londres, em 1986. A mãe, que parece ter muita importância na vida da cantora (há várias fotografias dela espalhadas pela casa), é Evelyn Welch, norte-americana que atualmente é Professora de Estudos Renascentistas e Vice-Diretora de Artes e Ciências da universidade King’s College, em Londres. O pai, Nick Welch, é publicitário que virou administrador de uma área para camping. A família era abastada e bem relacionada. Uma das paredes da casa tem uma caricatura emoldurada do avô dela, Colin Welch, ex-subeditor do jornal The Daily Telegraph. Um dos tios de Florence é o satirista Craig Brown.
Ela tem dois irmãos mais novos e três meio-irmãos. No início da adolescência, os pais se divorciaram e se casaram novamente. O pai agora vive fora de Londres, mas Florence escolheu morar em uma ruazinha perto de um gasômetro vitoriano para ficar perto da casa da mãe. Apesar disso, o relacionamento delas é visivelmente complexo.
“Minha mãe é uma mulher muito inteligente, lógica e altamente acadêmica. Eu era um poço desregrado de emoções bem difícil de lidar, que não era boa em matemática, nem em ortografia e só gostava de cantar e dançar. Essa não era a área de conhecimento da minha mãe. Então acho que desde o início houve a sensação de não ser muito bem compreendida. De onde veio essa criatura estranha? Eu rio disso hoje, mas é uma questão bem dolorosa, sabe? A música sempre foi minha fonte de sobrevivência.”
Ela estudou na Alleyn’s School em Dulwich, onde foi uma aluna acima da média. Por um breve período, frequentou a faculdade Camberwell College of Arts, mas largou para seguir carreira na música. “Havia uma grande cena musical de shows e festas em locais abandonados e eu só queria participar disso. Eu costumava cantar acappella em noites para amadores. Não planejei nada, só queria ver se conseguia fazer o que todos os caras estavam fazendo.”
Ela diz que nunca pensou na possibilidade de alcançar sucesso internacional, mas quando levou seu trabalho para os EUA, achou o país muito acolhedor.
“Acho que os EUA têm uma facilidade maior para elogiar, é algo mais natural para eles. A Inglaterra é meio aquele pai ou mãe carinhoso e que dá muito apoio, mas também quer garantir que o sucesso não suba à cabeça do filho. Então não há elogio que venha sem uma pequena crítica ou piada,” compara ela.
Essa frase, segundo Florence, “literalmente descreve os meus pais, então peço sinceras desculpas se eu projetei esse comportamento no país inteiro. Morar e trabalhar na Inglaterra mantém os meus pés no chão. Acho que seu vivesse muito tempo nos Estados Unidos, talvez ficasse muito egocêntrica. Preciso do céu nublado e da discrição britânica pra me equilibrar.”
Se o lado musical sempre veio com facilidade, Florence se preocupa com as letras em um nível quase neurótico. No processo de compor suas canções, ela enche cadernos e mais cadernos de páginas quadriculadas com palavras, frases e desenhos. “Escrever em linhas retas me lembra de quando eu ia mal na escola, então me sinto mais confortável com os quadrados.”
A cantora puxa alguns cadernos da estante. O primeiro, no qual escreveu a maior parte das letras do álbum de estreia, é um bloco verde coberto de estrelas e adesivos, com a frase “FLORENCE ODEIA VOCÊS, P----” escrita em pequenas letras coloridas. “Eu era jovem,” justifica ela, ruborizando. Páginas inteiras são tomadas por esboços de letras escritas com caneta hidrográfica em letras maiúsculas. Uma das páginas mostra o esboço de um homem de barba desenhado com raios da morte saindo dos olhos embaixo da frase “o rosto cinza de Cristo”.
“Às vezes uma música inteira aparece por mágica, como se tivesse caído do céu. E às vezes é um álbum de recortes que fui colecionando… Um sonho, um SMS, uma lembrança e, de alguma forma, quando junto tudo isso acaba fazendo sentido. Eu penso demais em todos os outros aspectos da minha vida, quase até a exaustão, então tento não fazer isso com as músicas. É um processo impulsivo e instintivo.”
Às vezes ela tem dificuldade com o turbilhão de fama que a levou ao auge da profissão e a sair em turnês pelo mundo. Florence reagiu a essa primeira onda de sucesso bebendo muito e indo a todas as festas que podia. “O hedonismo era como um disfarce. Eu era uma garota tímida e tive que mudar de personalidade. No começo é libertador, mas depois vira uma prisão. Eu pensava que precisava de uma ressaca para compor.”
Após o fim do relacionamento tempestuoso e intermitente com o planejador de eventos James Nesbitt em 2014, ela compôs o terceiro álbum em um estado de emoções à flor da pele, sempre trabalhando com amigos próximos. “Eu chorava no estúdio, vestida com roupas de ginástica. Precisei mesmo de muito apoio pra colocar tudo para fora.” Mas ela parou de beber nos dois anos seguintes e saiu do fundo do poço.
“Redescobri minha autonomia. Gosto de ir de bicicleta para o estúdio todo dia, voltar para casa e cozinhar para mim, de ter uma vida reservada e ler bastante. Eu me sinto mais criativa do que nunca. A alegria a facilidade com que tudo está acontecendo são inacreditáveis.”
Novo álbum:
- Ela passou um ano longe dos shows e está começando a trabalhar em um novo álbum. Florence não quer contar muito a respeito de seu novo projeto, mas diz que vai explorar o “buraco negro”
em que caiu.
“Estou mais feliz agora, estou contente, mas nunca vou estar curada, jamais. Não acho que é assim que funciona. Muitas coisas quase funcionaram para mim: as festas e a bebida quase funcionaram, ser famosa e bem-sucedida quase funcionou, o relacionamento quase funcionou… Mas nada disso te sustenta. São coisas transitórias. Apesar disso, tudo está caminhando para ficar bem.” -
Cantar e compor são os bálsamos constantes da vida de Florence Welch. “A música sempre me traz alegria, mesmo se falar de algo muito triste ou doloroso. Estou fazendo o quarto álbum agora e, sinceramente, nem consigo acreditar. Você sente que os sonhos de infância não são feitos para se realizar, mas o meu se realizou.”
Ela faz uma careta e depois ri. “Isso é tão piegas, mas é bom acabar a entrevista rindo. No começo eu achei mesmo que ia chorar.”