Florence divulgou no Twitter uma entrevista que deu à editora Pengiun Books para promover seu livro Useless Magic. Leia a conversa traduzida abaixo da imagem. Todos os direitos desta tradução estão reservados para o Site Florence Brasil. O texto em inglês pode ser lido aqui. Todas as imagens são reproduções de páginas do Useless Magic retiradas da entrevista original.
Florence + the Machine conquistou o mundo da música. Agora, a vocalista Florence Welch está retomando a paixão pela leitura ao lançar seu primeiro livro, Useless Magic. Ela explica seus motivos a Greg Cochrane.
Já faz mais de uma década desde que Florence + The Machine se lançou com Kiss With a Fist, música que marcou os primeiros passos em uma carreira que levou a banda ao status de headliner dos maiores eventos musicais de hoje. Segundo a própria Florence, esses primeiros anos foram um turbilhão. O que começou como uma colaboração adolescente com a amiga Isa Summers em Camberwell, região sul de Londres, rapidamente se transformou em um período definido pelo sucesso crescente, festas que duravam a noite toda e o tipo de ressacas que só uma pessoa de 22 anos consegue superar. Florence admite que essa época, no fim dos anos 2000 parece meio nebulosa.
“Quando eu estava bebendo muito, eu perdia tudo: telefones, cartões, namorados, mas nunca perdi meus cadernos,” conta ela rindo. “Eu vivia escrevendo e de alguma forma sempre conseguia chegar em casa com o caderno encharcado nas mãos.”
Essa paixão pela escrita continua até hoje e está bem clara em Useless Magic, seu primeiro livro. Na capa está escrito “letras de música e poesia”, mas é muito mais do que isso: encadernado em uma bela capa vermelha em tom fosco, trata-se de um álbum de recortes, retrospectiva da carreira que conta ainda com os escritos contemporâneos de Florence. Como ela explica no prefácio, “você pode ter tudo.” E o livro dá mesmo essa sensação.
Capa do livro Useless Magic. Garanta o seu aqui.
As letras estão lá: as palavras do forte catálogo de quatro álbums (Lungs, Ceremonials, How Big How Blue How Beautiful e o mais recente, High As Hope) estão reunidas pela primeira vez e você encontra títulos familiares, como Dog Days Are Over, Rabbit Heart (Raise It Up), Shake It Out, Spectrum e Hunger. E há também os poemas: 16 textos originais, que ela descreve como “bugigangas enlameadas.” Em um deles ela admite que as palavras “não eram belas o bastante, sangrentas e esfarrapadas demais” para serem transformadas em música. Os textos são intercalados com materiais saídos diretamente de suas caixas de lembranças pessoais: fotos de Polaroid, listas de tarefas (“Ir à Tate Modern, ir à Fopp”), ideias rascunhadas em blocos de anotações distribuídos em hotéis, setlists de shows e rabiscos distraídos. Em determinado ponto surge uma antiga lista de canções favoritas de outros artistas que vai de Klaxons a Tom Waits, passando por Roisin Murphy e Bon Iver. Tudo isso é complementado por obras de arte, tanto da própria Florence quanto de alguns dos artistas favoritos da cantora, como William Morris e Gustav Klimt. Tudo isso foi compilado é com muito carinho e atenção aos detalhes. Para os fãs, é um objeto instanteamente colecionável. Para os leitores casuais, é uma introdução abrangente a uma artista de sucesso mundial, uma obra menos ambígua do que ouvir um de seus álbums. Ou como Florence define, “é mais reveladora.”
Muito antes ser musicista, Florence era uma leitora ávida. Relembrando esse período, ela se define como uma “criança tímida” que buscava “conforto nos livros.” A literatura fazia parte da família: a mãe, americana que leciona em Londres, é professora de estudos renascentistas com obras publicadas e o pai, publicitário, já escreveu poesia.
“Eu era uma leitora voraz muito antes de pensar em sem artista. A leitura foi o meu primeiro amor. Eu realmente era uma leitora voraz. Já era escapista desde criança.”
“A leitura foi o meu primeiro amor. Eu realmente era uma leitora voraz. Já era escapista desde criança.”
A música só virou prioridade bem depois. Florence foi estimulada a cantar por um dos avós, entrou para o coral (e de vez em quando levava bronca por cantar alto demais) e se apresentava em eventos familiares. Enquanto estudava na Camberwell College of Artis, ela começou a compor com Isa Summers no estúdio da amiga em Londres: as duas se sentavam de costas uma para a outra no espaço apertado, usavam instrumentos improvisados para gravar demos e tinham uma lista de “mandamentos” colada na parede. Elas jogavam as frustrações pelos relacionamentos fracassados nas canções que seriam a espinha dorsal do primeiro álbum da Florence + the Machine, Lungs, lançado em 2009. Naquele ano elas ganharam um BRIT Award e o álbum chegou ao primeiro lugar das paradas.
A cada lançamento após a estreia o nível de sucesso aumentava. A banda estourou no Reino Unido e internacionalmente (o terceiro álbum How Big How Blue How Beautiful liderou a parada da Billboard, sendo o primeiro número um para a banda nos EUA). Florence e Isa dividiram o palco com o U2 e, mais recentemente, com os Rolling Stones. Quando o Foo Fighters de Dave Grohl precisou cancelar o show em que seriam a atração principal de Glastonbury em 2015, Florence + the Machine foi rapidamente promovida e fez um apresentação que marcou a carreira da banda e tão empolgante que Welch levou meses para se recuperar da “onda.” O novo álbum High As Hope, lançado em junho de 2018 indica um ano cheio de grandes planos pela frente.
O Useless Magic obrigou Welch a reviver tudo isso. Ao explicar o método consagrado de composição que adota, ela descreve suas canções como “avisos subconscientes ou mensagens para mim mesma, mas eu geralmente só vou saber o que estou tentando dizer muitos anos depois.” Ao reunir o material para o livro, Welch sentiu segurança no que encontrou.
“É interessante olhar para trás e ver que há alguns temas em comum no seu trabalho, que você sempre teve interesse nas mesmas coisas. Há algo estranhamente reconfortante nisso,” analisa.
“É engraçado,” continua Florence. “Todos perguntam sobre a ‘persona de palco’ mas nesse caso eu respondo ‘Não tenho certeza se ela existe!' No livro é só uma pessoa. Embora esteja explorando caminhos diferentes, você é a mesma artista o tempo todo. Acabei me dando conta que 'ah, sempre fui eu mesma.’ É meio inevitável. Foi estranhamente positivo reunir esta obra. Embora fosse muito confuso e avassalador havia um fio unindo tudo.”
Mostrar seus poemas foi algo inédito para Welch. O artista conceitual Robert Montgomery, conhecido pelas instalações site-specific baseadas em texto, leu alguns rascunhos. Ela mandou outros para Nick Cave “porque ele é escritor, além de músico. Eu o admiro bastante e ele deu algumas dicas.” A poetisa e escritora Yrsa Daley-Ward também ofereceu conselhos. “O estímulo deles me ajudou muito,” reconhece a cantora.
Os poemas de Welch são diferentes de suas músicas e, como escritora, ela teve dificuldades com essa diferença. “As canções são um pouco mais soltas. Eu já tenho uma voz consolidada [como compositora]. A voz da canção é quase separada de mim, algo que você canaliza,” explica, analisando a diferença. Alguns trechos aparecem duas vezes no livro porque acabaram em uma música e também são poemas, com algumas edições. “Boa parte disso ainda é uma espécie de exploração do que significa ser compositora e poetisa titubeante,” pondera Welch.
Em comparação às letras de música, os poemas são bem menos abstratos e oníricos, revelando caracterísicas como senso de humor a tendência à contemplação . As experiências se baseiam muito mais no cotidiano, embora uma parte do cotidiano de Florence Welch envolva dormir de resseca no estúdio de Bryan Ferry (Song Continued) ou bater papo com Liza Minnelli em um show da Lady Gaga (American Mother).
“Achei engraçado incluir a Lady Gaga em um poema porque ela é um ícone tão grande da cultura pop e a poesia pode ser vista como altamente romântica ou algo imponente e eu queria subverter um pouco isso. Acho que posso ser considerada uma estrela pop, mas então o que significa incluir esses outros aspectos do meu mundo nos poemas? A cultura pop, a inter-poesia, misturar tudo isso... Eu acho muito interessante,” explica a inglesa.
Contudo, essas citações de nomes de famosos são raras. O livro tem poemas sobre os pais de Florence (New York Poem (For Polly), American Mother), o papel das pessoas silenciosas em um mundo estridente graças à tecnologia e a política (Rage) e a natureza surreal da fama (I Guess I Won’t Write Poetry), no qual ela escreve: “Ser ‘famosa’ é como ser um fantasma ansioso/Com medo de assustar as pessoas/Esperando passar despercebida.”
A jornada fez Welch refletir; “A poesia acabou sendo muito mais reveladora do que as canções, em vários aspectos. As canções podem ser muito grandiosas e ter a ambição do tamanho de uma catedral. Às vezes a poesia pode ser mais corriqueira.”
“A poesia acabou sendo muito mais reveladora do que as canções, em vários aspectos.”
“Quando estava escrevendo o poema Song Continued, acho que estava descobrindo algo a meu respeito. A última frase: “Ah/Aqui está/Será o bastante” é de certa forma dolorosa para mim. Às vezes durante a escrita você fala a verdade para si de um jeito que não consegue fazer no dia a dia. Aí você fica, 'ah, nessa confusão, nesse pântano de tudo, eu só estava tentando ser o bastante.' Eu só estava tentando fazer algo bonito para me sentir bem. A poesia pode revelar partes suas que você não conhecia.”
Fazer o Useless Magic deixou Welch mais confiante e com um novo ímpeto. “Eu ando escrevendo esses textos chamados 'Sermões Diários'. São muito esquisitos,” conta ela aos risos. “Isso definitivamente me estimulou a escrever mais.”
Ler continua a ter papel fundamental para Florence e ela não sofre com a falta de inspiração. Desde 2013, Welch lidera o Between Two Books, clube do livro organizado por fãs no qual a comunidade troca recomendações com frequência. À medida que o clube foi crescendo, Florence convidou amigas célebres como Greta Gerwig, Bat For Lashes e Fiona Apple para recomendar seus livros favoritos, que serão lidos, criticados e debatidos pelos seguidores.
“Isso está sendo um presente incrível na minha vida. O que amo no clube é o fato de ser totalmente organizado por fãs. São elas que gerenciam a comunidade. Eu fico espantada com essas jovens cheias de consciência social e empolgação sobre o mundo. A paixão delas pela leitura, pelas causas em que acreditam e pela comunidade me inspira demais.”
Agora, após mais de dez anos sendo conhecida pelas músicas, Florence Welch pode adicionar o próprio livro à lista de leituras. “É engraçado se ver reunida no papel,” diz ela.
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